quarta-feira, 25 de maio de 2011

O desaparecido.

Tarde fria, e então eu me sinto um daqueles velhos poetas de antigamente que sentiam frio na alma quando a tarde estava fria, e então eu sinto uma saudade muito grande, uma saudade de noivo, e penso em ti devagar, bem devagar, com um bem-querer tão certo e limpo, tão fundo e bom que parece que estou te embalando dentro de mim.

Ah, que vontade de escrever bobagens bem meigas, bobagens para todo mundo me achar ridículo e talvez alguém pensar que na verdade estou aproveitando uma crônica muito antiga num dia sem assunto, uma crônica de rapaz; e, entretanto, eu hoje não me sinto rapaz, apenas um menino, com o amor teimoso de um menino, o amor burro e comprido de um menino lírico. Olho-me no espelho e percebo que estou envelhecendo rápida e definitivamente; com esses cabelos brancos parece que não vou morrer, apenas minha imagem vai-se apagando, vou ficando menos nítido, estou parecendo um desses clichês sempre feitos com fotografias antigas que os jornais publicam de um desaparecido que a família procura em vão.

Sim, eu sou um desaparecido cuja esmaecida, inútil foto se publica num canto de uma página interior de jornal, eu sou o irreconhecível, irrecuperável desaparecido que não aparecerá mais nunca, mas só tu sabes que em alguma distante esquina de uma não lembrada cidade estará de pé um homem perplexo, pensando em ti, pensando teimosamente, docemente em ti, meu amor.

RUBEM BRAGA

quarta-feira, 18 de maio de 2011

domingo, 15 de maio de 2011

O outro lado da palavra.

Sempre considerei a palavra despir como o ato de tirar a roupa. Nessa noite, porém, aprendi a atribuir outro significado a esse vocábulo.
Assistindo à peça "Estrangeiros", no teatro Carlos Gomes, na companhia da minha mãe e dos meus amigos Rúbia e Deh, refleti sobre como o ser humano se esconde atrás de suas "roupas": seu status social, seus papéis na sociedade, sua vaidade.. E questionei-me: será que teremos a coragem, um dia, de nos despirmos, tirarmos nossas armaduras, e mostrarmos quem realmente somos, sem nenhum pudor? Complemente nus, um de frente para o outro, indefesos, agiríamos de que forma? Não teríamos ao nosso alcance nenhum recurso, a não ser a verdade de quem somos, nossa real face. Seria humilhante para a maioria e libertador para aqueles que realmente entendem o significado disso tudo. 
Durante nosso crescimento as pessoas tentam impor as verdades absolutas do mundo, ditam regras de como viver, dizem para cada um o que deve pensar, como deve agir, o tom de voz, o olhar, a expressão corporal. Passamos por um treinamento intensivo de 'como ser um humano'. Tirar as diversas roupas que nos vestiram é complicado para aqueles que se negam a pensar a respeito. 
Preferem continuar seguindo a mesma trilha que um dia um bode abriu caminho. 

Criticam o teatro por dizer que ele não retrata a vida, que ele é pura fantasia. 
Tolos!
A arte imita a vida. E naquele palco, hoje, pude ver o quanto somos manipulados, e, acima de tudo, o quanto somos covardes!



terça-feira, 10 de maio de 2011

Um trecho de Divã.

Sou eu que começo? Não sei bem o que dizer sobre mim. Não me sinto uma mulher como as outras. Por exemplo, odeio falar sobre crianças, empregadas e liquidações. Tenho vontade de cometer haraquiri quando me convidam para um chá de fraldas e me sinto esquisito à beça usando um lencinho amarrado no pescoço. Mas segui todos os mandamentos de uma boa menina: brinquei de boneca, tive medo do escuro e fiquei nervosa com o primeiro beijo. Quem me vê caminhando na rua, de salto alto e delineador, jura que sou tão feminina quanto as outras: ninguém desconfia do meu hermafroditismo cerebral. Adoro massas cinzentas, detesto cor-de-rosa. Penso como um homem, mas sinto como mulher. Não me considero vítima de nada. Sou autoritária, teimosa e um verdadeiro desastre na cozinha. Peça para eu arrumar uma cama e estrague meu dia. Vida doméstica é para gatos.
(Divã, Martha Medeiros, página 9)


Tirando a parte do "sou um desastre na cozinha", eu me considero a personificação viva dessa personagem. Li somente as primeiras páginas desse livro ainda, porém já assisti ao filme e tenho a certeza de que me divertirei ainda mais com a história e as dúvidas e os medos de Mercedes.
Recomendo o filme, recomendo a obra. E recomendo Martha Medeiros!

sábado, 7 de maio de 2011

Não mais lembrança. Agora é a realidade!

Hoje tinha festa na capela São José, que localiza-se no bairro onde moro. Antes de eu mudar de casa, em 2008, devido à tragédia que assolou a cidade de Blumenau, eu frequentava esse lugar, no mínimo, uma vez por semana. Vi essa capela ser construída com muito suor e com o empenho de toda a comunidade. As primeiras missas foram rezadas com um altar engembrado e no chão de terra. Aos poucos, o prédio foi contruído, foram comprados os bancos, um altar, a pia sacramental, e toda a estrutura necessária para que a capela se tornasse um local que pudesse abrigar a todos os irmãos e irmãs da comunidade foi adquirida.

Um terreno baldio tornou-se um local em que as pessoas pudessem se encontrar para rezar. Mais tarde foi contruída a área de festas, com barracas, churrasqueiras e cozinha completa. Assim, festas como a do padroeiro e de São João puderam se tornar tradição.

Minha família e eu sempre fomos muito presentes na Igreja. Meus pais moram há mais de 30 anos no bairro e conhecem todos que aqui moram. São figuras presentes na Igreja, na escola, na Associação de Moradores, enfim, em todos os locais que necessitam da participação de pessoas da comunidade. Com o tempo eu comecei a ajudar também. Com relação à capela, participava do grupo de jovens, em que montávamos peças de teatro, fazíamos parte do coro, das leituras de missa, nos encontrávamos aos sábados para conversar, tomar café. E participava, também, do planejamento e execução das festas. Geralmente ficava responsável, junto com outras pessoas, da barraca da pescaria. Fazíamos peixes, enchíamos uma caixa de água, enfeitávamos o local, arrumávamos os brinquedos, o caixa, as varas... e na hora da festança era só alegria e trabalho.

No dia em que todos esses momentos foram tirados de mim, senti que um vazio se formou em meu interior. Repentinamente, minha rotina foi modificada, fui afastada das pessoas que gostava. Saí do lugar onde me sentia confortável, do local que eu chamava de lar.
Dois anos se passaram, e eu voltei para meu lugar de origem. Estou novamente ao lado das minhas amigas, dos meus tios e primos, das pessoas que conheço desde que eu era beeem pequena. Nunca me senti tão feliz!
Na festa de hoje, que eu comentei no início do post, reencontrei tanta gente. E o melhor: todas sabem que sou, sabem meu nome, conhecem minha família há anos, me viram crescer, contam histórias de quando eu era pequena, sorriem, me abraçam, transmitem um carinho que é único. Não há lugar no mundo que eu sinta mais amada do que aqui no bairro onde moro. Posso viajar o mundo quantas vezes quiser e puder, mas tenho a certeza de que sempre retornarei para cá, para o meu cantinho, para o meu Zendron.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Imagens de um tempo incrível!

Essa semana estou carente, admito! Acho que li demais Caio Fernando Abreu e Martha Medeiros. Além, de ter refletido sobre minha situação atual de vida.

Vejo que muitas de minhas amigas estão namorando, ou pelo menos têm alguém ao lado delas a quem elas podem recorrer em um momento de extrema alegria ou angústia. Claro que tenho muitos amigos, amigos de verdade, que estão ao meu lado 24 horas por dia, 365 dias por ano (ou 366 em ano bissexto). Eles me abraçam, riem de mim ou comigo, oferecem seus ombros, estendem suas mãos, caminham ao meu lado, ouvem meus desabafos, me dão tapas na cara para eu acordar para a realidade... enfim, são anjos da guarda!

Porém, o afeto que eles me oferecem não supre uma certa necessidade que todo ser humano tem: ter alguém que te ame e que sussurre isso em seu ouvido à noite, que te esmague em um abraço, que sonhe contigo, que pense em você em todos os momentos e que viva ao teu lado compartilhando um sentimento único de confiança, companheirismo e amor.

Eu nunca tive isso. Não sei como é ter um cara do teu lado dizendo que gosta de mim, que quer minha companhia sempre.
Tive um namoradinho quando tinha 14, 15 anos, mas nem conta. Foi uma experiência, claro, entretanto éramos amigos, e somente isso. Não nos tratávamos como namorados. Parece estranho, mas é a verdade. Nunca tive um relacionamento sério!

Vivi todos esses anos sustentando ilusões, alimentando esperanças.
Eu dizia (e da boca pra fora ainda digo) que primeiro iria estudar para depois namorar. Penso, porém, como seria bom ter alguém me apoiando nesses momentos, alguém que me dê carinho, me telefone, diga que gosta de mim e se interessa por minha vida.

Dê tempo ao tempo. O ensinamento mais sábio que aprendi com meu pai!

Se alguém, um dia, quem sabe, gostar de mim pelo que sou, viverei ainda mais feliz.
Se isso nunca acontecer, viverei feliz também, com meus livros e gatos, mas com a estranha sensação de que está faltando algo...

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Uma do poetinha...

Encontrei um lindo poema no material de apoio de Teoria Literária que a professora Tuca fez para seus queridos alunos. O poema é obra do nosso poetinha, Vinícius de Moraes, e o título é Minha namorada.



Meu poeta, eu hoje estou contente
Todo o mundo, de repente
Ficou lindo, ficou lindo de morrer

Eu hoje estou me rindo
Nem eu mesma sei de quê
Porque recebi uma cartinhazinha de você:


Se você quer ser minha namorada,
Ah, que linda namorada você poderia ser,
Se quiser ser somente minha
Exatamente essa coisinha
Essa coisa toda minha
Que ninguém mais pode ter,

Você tem que me fazer um juramento

De só ter um pensamento:
Ser só minha até morrer.

E também de não perder esse jeitinho
De falar devagarinho
Essas estórias de você

E de repente me fazer muito carinho
E chorar bem de mansinho
Sem ninguém saber por quê.